O filme "Dogman", dirigido por Luc Besson, mergulha em uma jornada intrincada que explora questões de identidade, trauma e representação. Por meio do protagonista, Douglas Munrow, interpretado por Caleb Landry Jones, somos conduzidos por um enredo repleto de nuances e ambiguidades.
Do mesmo diretor e roteirista de Lucy (2014), o filme parece ser uma experimentação de como construir um roteiro depois de pensar em uma cena inicial e seus elementos.
O diretor Luc Besson aborda este projeto com uma variedade de ambições e enfoques. Ele parte de um roteiro tão volumoso, disperso e improvável que poderíamos pensar que não foi realmente criado exclusivamente pelo cineasta, embora essa seja a realidade.
Em menos de duas horas, o filme é uma comédia, uma fábula infantil, um drama de gangsteres, e ainda explora a identidade queer e a superação de um indivíduo com deficiência que inesperadamente cuida de centenas de cachorros.
Besson, conhecido por preferir filmar atrizes loiras em filmes como "Joana D'Arc", "Anna - O Perigo Tem Nome" e "Lucy", agora explora a representação da diferença - ou, pelo menos, sua visão dela.
Desde o início, somos apresentados a um personagem singular: um indivíduo com orientação sexual e identidade de gênero ambíguas, que encontra conforto em se vestir como mulher e em participar de performances de drag queens.
No entanto, sua jornada vai além disso. Douglas também enfrenta a deficiência física, incapaz de mover as pernas, mas ainda capaz de permanecer de pé por breves momentos. Esta dualidade física e emocional é o cerne da narrativa, explorada com sensibilidade e profundidade.
Besson contextualiza Douglas em um ambiente familiar marcado pela violência e pelo abuso. Seu pai, retratado por Clemens Schick, é uma figura de maldade pura, cujas ações permitem ressaltar a inocência e a pureza do protagonista. Os flashbacks perturbadores da infância de Douglas nos oferecem visões dolorosas sobre suas origens e os traumas que moldaram sua jornada.
No entanto, o filme não se limita a explorar o passado de Douglas. Grande parte do roteiro é dedicada a examinar dois elementos-chave em sua vida: seu amor pelos cachorros e sua feminilidade. Embora esses aspectos sejam importantes para entender a complexidade do personagem, às vezes parecem ser explicados excessivamente, comprometendo a naturalidade da narrativa.
Os momentos mais cativantes do filme ocorrem nas interações entre Douglas e a psiquiatra Evelyn, interpretada por Jojo T. Gibbs. Essas cenas oferecem um vislumbre da verdadeira humanidade do protagonista, longe das distrações dos cenários extravagantes e da presença dos cachorros. As performances de Douglas no palco, vestido como divas icônicas, também destacam o talento do ator e a capacidade de Besson em evocar emoções genuínas.
No entanto, a direção intervencionista de Besson por vezes obscurece a narrativa. O filme oscila entre diferentes gêneros e tons, resultando em uma falta de coesão que torna algumas cenas desconexas e fora de lugar.
No final, "Dogman" oferece uma visão complexa e multifacetada do protagonista e de seu mundo. No entanto, sua tentativa de construir uma imagem externa peculiar muitas vezes obscurece a verdadeira complexidade interna do personagem. Apesar disso, o filme é uma exploração intrigante das nuances da identidade e do trauma, enriquecida pelas performances cativantes de seu elenco principal.
Ficha técnica
Título original: Dogman
Ano: 04 de Janeiro de 2024 (Brasil)
País de origem: França
Gênero: Drama, Fantasia, Ação
Duração: 113 minutos
Direção: Luc Besson
Elenco: Caleb Landry Jones, Jojo T. Gibbs, Christopher Denham, Clemens Schick, John Charles Aguilar, Grace Palma, Iris Bry, Marisa Berenson, Lincoln Powell, Alexander Settineri