Séries & TV

Crítica: Power Rangers Cosmic Fury

Com uma temporada mais curta, produção marca o fim de Power Rangers como conhecemos.

 

Ao longo das últimas 3 décadas, entre muitos altos e baixos, toda uma geração da cultura pop com robôs que parecem brinquedos, armas que parecem brinquedos, alienígenas, demônios, dinossauros, adolescentes com atitude, uniformes de cores primárias exageradamente saturadas e outros mil elementos que fazem Power Rangers ser o que é. E eis que surge o momento de encerrar esse longínquo ciclo e conferir se a última temporada (ainda é estranho dizer isso) conseguiu honrar tamanho legado.  

Os custos de uma viagem rápida

Começando imediatamente após os eventos do final da temporada anterior, os episódios iniciais de Cosmic Fury demonstram perfeitamente as intenções que Simon Bennet e sua equipe tinham ao criar esse último arco narrativo: sem fillers, sem "monstro-da-semana", sem lição de moral, sem alívios cômicos desnecessariamente longos. Toda cena deve ser utilizada sabiamente e deve servir para contar a história construída para esse epílogo.

Por um lado, essa estrutura narrativa era exatamente aquilo que grande parte dos fãs da franquia desejavam para as produções televisivas, tanto é que as temporadas ditas como favoritas seguem esse propósito em diferentes graus. Por outro lado, com tantas coisas acontecendo em um espaço de tempo relativamente pequeno, você se pergunta se 10 episódios de 20 minutos serão o suficiente para resolver tudo o que foi estabelecido. 

O roteiro parece consciente disso e consegue lidar de forma razoável com essa questão. Eles criam uma espécie de "hierarquia de plots" para estruturar todas as histórias dentro desse espaço de tempo de acordo com a prioridade dos eventos. Funcionou pela maior parte do tempo, mas é possível ver as falhas desse sistema na segunda metade da temporada.

Eles querem nos passar a ideia de que a Terra e outros planetas foram tomados por Zedd e a Squid Inc., de que, pouco a pouco, outras equipes de Rangers foram derrotadas e capturadas, de que a equipe Cosmic Fury, junto a uma pequena célula de resistência formada por rafkonianos, é a única esperança do planeta, mas eles decidem apenas nos contar isso ao invés de mostrar o que realmente está acontecendo. Você não consegue se conectar completamente à situação.

Um dos princípios essenciais do audiovisual é o de mostrar ao espectador o que está acontecendo, não simplesmente contar. Talvez pela falta de tempo, eles se limitaram apenas a contar, mas acredito que um ou dois episódios adicionais eram suficientes para convencer ainda mais o espectador a respeito da ameaça de Zedd. Se não isso, que pelo menos inserissem pequenas cenas adicionais ao longo dos episódios para contextualizar ainda mais a situação na Terra.


A longo prazo, essa falta de material adicional acabou os prejudicando, especialmente nos episódios finais. Eles vendem a ideia de uma ameaça que pode erradicar todo o bem que existe no universo, no melhor estilo "Contagem Regressiva Para Destruição" (um dos finais de temporada mais icônicos da franquia), mas eu não consegui comprar a ideia completamente porque eles não construíam uma atmosfera crível o suficiente.

Além disso, o caminho que eles tomaram no episódio final para resolver tal ameaças foi, no mínimo, bem inesperado. Vai se criando uma expectativa para uma batalha de grandes proporções, mas eles decidem ir pelo caminho contrário. Eles apostam na simplicidade, no jogo de palavra, no diálogo, nas conveniências de roteiro. Outras temporadas também seguiram por caminho parecido (inclusive temporadas amadas pelos fãs como Espaço e Força do Tempo), mas acredito que a decisão tomada aqui não foi a das melhores.

Ainda que funcione como finalização do arco narrativo que vinha sendo construído desde 2021, ao considerar que esse foi o último episódio de Power Rangers no formato como o conhecemos, que esse capítulo deveria encerrar 30 anos de legado, fica uma sensação amarga. Não sei se a equipe de produção tinha isso em mente ao construir esses episódios finais, mas acredito que não. Como fã, sinto que foi um series finale aquém do esperado para uma franquia tão grande.

Uma meia adaptação

Expectativa...

Além de encerrar esse ciclo de 30 anos de história, um dos outros objetivos da Hasbro para Cosmic Fury foi o demonstrar um pouco de sua visão para o futuro da franquia. Percebe-se que ela pretende tornar Power Rangers em uma entidade própria, algo além de ser uma mera adaptação das séries Super Sentai japonesas. 

E ela decidiu começar por criar um uniforme 100% original para a temporada, fazendo com que todas as batalhas em terra fossem cenas originais e as únicas cenas a serem utilizadas da série Uchu Sentai Kyuranger fossem as de batalhas de Zords e MegazordsNão nego que isso acabou servindo para dar mais liberdade para que a equipe de dublês e demais membros da produção criarem suas próprias cenas de batalha. Mas nada estava os impedindo de fazer isso com os uniformes da série Super Sentai e talvez eles deviam ter seguido esse caminho.

Os uniformes originais criados para a temporada me incomodaram. Eles são simplórios demais. O material utilizado me pareceu bastante barato e a aparente utilização de enchimento para dar uma sensação de maior volume no peito e abdômen só piorou a situação. Outras temporadas já tiveram uniformes com menos detalhes na roupa, mas isso aqui é um outro nível, algo que mais parece um retrocesso.

Realidade...

O que vem por aí

É o fim de Power Rangers como conhecemos. De agora em diante, mudanças grandiosas estão por vir. A franquia passará a ser comandada por Jonathan Entwistle (The End of the F***ing World) e as futuras produções serão exclusivas da Netflix. Muito se fala de que a franquia irá entrar "em pausa" durante 2024 e as novas produções chegarão somente em 2025. 

É provável que, a exemplo de Cosmic Fury, as temporadas serão mais curtas e os arcos narrativos serão colocados em destaque, o que irá facilitar muito caso a duração dos episódios seja incrementada, o que é algo positivo. Entretanto, penso que afastar Power Rangers de Super Sentai é uma jogada que, caso não seja bem planejada, não será benéfica no longo prazo. 

Os elementos que faz Power Rangers ser Power Rangers inclui os elementos vindos das séries japonesas. Ao retirar ou diminuir tais fatores, o que sobra é substancial o suficiente para a franquia manter sua identidade? É uma pergunta cuja resposta só o tempo dirá.

O fim


Posso afirmar que Power Rangers Cosmic Fury foi uma boa experiência, talvez uma das melhores experiências que eu já tive com as temporadas mais recentes da série de TV (a última vez foi em 2019 com a 1ª temporadas Power Rangers Beast Morphers), principalmente por causa do carisma existente entre o elenco principal e as participações especiais. 

As diferentes decisões tomadas pela produção para se afastarem, até certo grau, da estrutura básica dos anos anteriores foram louváveis, devo reconhecer, mas os tropeços foram bastante evidentes e acabaram afetando minha experiência.

Independente do motivo, o que eu vi aqui foi o suficiente para desenvolver um genuíno interesse em acompanhar de perto o que virá nos próximos meses e anos em relação a rumores, notícias e produções (quem sabe finalmente eles façam uma série animada, eu totalmente assistiria). Acho que agora não sobraram desculpas para não ler os quadrinhos e mergulhar de cabeça no Universo Expandido.  

Até lá, obrigado pelas lembranças, Power Rangers. Até breve e que o poder os proteja.

Escreve para o GeekBlast sob a licença Creative Commons BY-SA 3.0. Você pode usar e compartilhar este conteúdo desde que credite o autor e veículo original.


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